Marcel Giró


Imprensa

Foto-cine.
Boletin do Foto Cine Clube Bandeirante

"Literatura? Nããão! Fotografia!"
Marcel Giró
Outubro 1968

Literatura? Nããão! Fotografia!
Marcel Giró


O redator deste Boletim, com um entusiasmo enorme e uma constância de pânico (pânico para quem se encontra como no meu caso), veio visitar-me, telefonando-me mais tarde com insistência para que lhe “fizesse” um artigo para publicar no Boletim deste mês. Meu desejo, não custa dizer, seria contentar-lhe, mas ... de que vou falar?

O tema forçosamente é: Fotografia. Meu forte não é precisamente literatura; prova disso é que, durante os meus estudos, as piores notas nos exames correspondiam a essa matéria. Enfim, creio que me encontro como muitos entusiastas da fotografia aos quais se pede um artigo seja qual for, sem medir as consequências que esta falta de capacidade para se expressar com a palavra, ou melhor dito, com a pena, pode acarretar. Se, ao contrário, pudéssemos nos expressar com a câmara, seria outra coisa!

Por outro lado, existem certas pessoas – por felicidade muito poucas – que artística e fotograficamente falando deixam muito a desejar, mas que no fundo possuem certa vaidade e toda a sua preocupação consiste em ver seu nome escrito em letras de forma encabeçando um artigo qualquer, mesmo que o seu conteúdo seja de um vazio incomensurável.

Os resultados desta maneira de atuar estão à vista. Colhei e folheai revistas e boletins, e a conclusão que tirareis será de uma tonalidade cinzenta. Por outro lado, isso se agrava com as discussões muitas vezes insonsas que se prolongam por vários meses. Pouco a pouco, aquele entusiasmo em esperar uma publicação vai decaindo até o momento em que somente a folheamos por inércia e superficialmente, na expectativa de alegrarmo-nos com a surpresa de um artigo ou uma reprodução de fotografia interessante. É a triste realidade, e creiam-me, gostaria de estar enganado.

Solução ao angustioso problema? Solicitar a colaboração de gente capacitada e recusar sistematicamente todo artigo que não manifeste um interesse pelos problemas “atuais”. Se não tivermos quem queira e possa colaborar, teremos que buscá-los fora. Traduzir das boas revistas estrangeiras os artigos que sejam interessantes para os amadores, já que não está ao alcance de todo o mundo poder adquirir estas revistas e também traduzi-las.

Causa verdadeiro cansaço folhear tantas páginas tratando de temas técnicos que interessam a uma minoria, e bem pequena. É preciso saber o que pensam os grandes fotógrafos da atualidade, um Man Ray, um Ortiz Echague, um Steinert, um Adams, um Steichen, etc., etc., e já sei que agora vou dizer um sacrilégio, mas a mim não interessa saber de que forma está construída uma lente, nem muito menos a composição química dos materiais que a tornaram possível, como tampouco saber os reveladores que já há vários anos são de domínio público. É necessário viver a fotografia no sentido puro da mesma, nos momentos atuais, assim como conhecer suas obras.

Se as minorias a que acima me referi querem estar em dia na parte da técnica pura da indústria fotográfica, existem suficientes tratados muito mais extensos do que qualquer artigo reproduzido.

Discutir em público se esta ou aquela lente é melhor do que outra, parece-me uma espantosa ridicularia. Às grandes indústrias, com seus poderosos meios tanto técnicos como econômicos, é a quem compete resolver estes problemas.

Nós, amadores, queremos e amamos a Fotografia como Arte. Deixemos que os técnicos e a indústria trabalhem por seu lado, e nós, se está ao nosso alcance, procuremos criar verdadeiras fotografias que esta é e deve ser a nossa finalidade.